ESMIRNA, A IGREJA CONFESSANTE E MÁRTIR. Subsídio para Lição Bíblica - 2º Trimestre/2012 /Postado pelo Pr. Altair Germano
A Fundação da Igreja em
Esmirna
Localizada ao norte de Éfeso, e com
uma população de cerca de 250.000 habitantes, a cidade de Esmirna era
considerada a mais bela da Ásia Menor. Sua beleza natural era fascinante. Seu
esplendor habitava entre o mar e as montanhas. Sua estrutura urbana era modelo
para as demais cidades de sua época. O comércio internacional favorecia
economicamente a cidade, que era grande exportadora de mirra.
Na condição de centro religioso, em
Esmirna eram adorados os deuses Cibele, Apolo, Asclépio, Afrodite e Zeus. O
culto ao imperador, que incluía a queima de incenso a imagem de César, foi lá
bastante difundido e praticado. [1]
Conforme Kistemaker:
Em
26 d.C., ela dedicou um templo ao imperador Tibério e se gabava de ser a
principal no culto ao imperador. Essa jactância agradou aos administradores
romanos, os quais fomentavam a paz e a unidade que caracterizavam o espírito de
Roma por todo o império. William Barclay escreve que, para tornar o espírito de
Roma tangível, os romanos apresentaram o imperador como sendo sua incorporação,
e assim surgiu o culto ao imperador. Ainda que alguns dos primeiros imperadores
discordassem de tal culto, a população o ativou ao ponto de tornar os
imperadores divinos.[2]
Não há registros específicos da
chegada do Evangelho e da fundação da igreja em Esmirna, mas podemos sem
problema algum enquadrar tais fatos no contexto de Atos 19.10:
Durou isto por espaço de dois anos,
dando ensejo a que todos os habitantes da Ásia ouvissem a palavra do Senhor,
tanto judeus como gregos.
Como na grande maioria dos casos, na
medida em que foi estabelecida pela pregação do Evangelho, a igreja em Esmirna
começou a provocar e a vivenciar algumas tensões, inquietações e desconfortos,
que aos poucos se transformou numa violenta e cruel perseguição.
A Perseguição à Igreja em
Esmirna
Ao anjo da igreja em Esmirna
escreve: Estas coisas diz o primeiro e o último, que esteve morto e tornou a
viver: (Ap
2.8)
Os historiadores sugerem que o bispo
da igreja em Esmirna por ocasião desta carta era Policarpo (69 d.C.-155 d.C.).
Como falar de Esmirna e não citar esse grande mártir da história do
cristianismo?
Policarpo fora discipulado por João.
Ao se tornar pastor da igreja em Esmirna manteve-se fiel à Palavra, mesmo sendo
sabedor da possibilidade do martírio.
No ano de 155 ainda estava vigente a
política de Trajano sugerida ao governador Plínio, onde os cristãos não eram
perseguidos, mas se delatados por alguém, e se negavam a adoração aos deuses ou
ao imperador, eram submetidos aos tribunais romanos, condenados, castigados e
martirizados. [3]
Eusébio de Cesaréia, em sua História
Eclesiástica, nos narra alguns detalhes do martírio de Policarpo, registrados
numa correspondência enviada pela igreja em Esmirna às igrejas de Ponto. Antes
de relatar os fatos relacionados ao martírio de Policarpo, na referida
correspondência se encontras detalhes sobre os métodos empregados pelos
martirizadores dos crentes em Esmirna:
Os que postavam à volta ficavam
tomados de assombro ao vê-los lacerados por chicotadas, expondo o próprio sangue
e artérias, de modo que a carne encerrada nas partes mais internas do corpo e as
próprias entranhas ficavam à vista. Eles eram deitados sobre conchas do mar e
sobre pontas afiadas de lanças sobre o chão. E depois de passar por todo tipo de
punição e tormento, eram por fim lançados às feras. [4]
Foi a postura de um jovem nobre
chamado Germânico diante de seu próprio martírio, que a fúria dos perseguidores
se voltou incontrolavelmente contra o líder da igreja em Esmirna. Persuadido por
muitos e de várias maneiras para que negasse a sua fé em Cristo, e que prestasse
culto ao imperador, Policarpo caminhou firme em direção ao estádio onde seria
martirizado. Quando o governador lhe pediu para que negasse a Cristo, Policarpo
lhe respondeu:
Oitenta e seis anos tenho-lhe
servido, e ele nunca me fez mal; e como posso agora blasfemar meu Rei que me
salvou? [... ] Ameaça-me com fogo que queima por um momento e logo se extingue,
pois nada sabes do julgamento que virá e do fogo da punição eterna reservada
para os perversos. Mas, por que te demoras? Faze o que desejas. [5]
As palavras de Policarpo enfureciam
cada vez mais os seus algozes. Como de costume, o arauto se dirigiu ao centro do
estádio e proclamou: “Policarpo confessa que é cristão”. Amarrado a uma estaca e
sem roupas, antes de seus executores acenderem o fogo, Policarpo fez a seguinte
oração:
Ó Pai de teu amado e bendito Filho
Jesus Cristo, por meio de quem recebemos o conhecimento a teu respeito. O Deus
dos anjos e poderes, e de toda a criação, e de toda a família dos justos, que
vive diante do pai, bendigo-te por teres me considerado digno deste dia e hora,
de fazer parte do número de mártires e do cálice de Cristo, até a ressurreição
da vida eterna, tanto da alma como do corpo, na felicidade incorruptível do
Santo Espírito. Que eu possa ser recebido entre eles em sua presença neste dia,
como um sacrifício rico e aceitável conforme preparou, revelou e cumpriu o fiel
e verdadeiro Deus. Assim, por essa causa e por todas as coisas louvo-te,
bendigo-te por intermédio do sumo sacerdote eterno, Jesus Cristo, teu Filho
amado. Por meio de quem seja a glória para ti no Santo Espírito, agora e para
sempre. Amém. [6]
Quando nos deparamos com as
narrativas acima, passamos a entender a necessidade da ênfase dada no início da
carta à igreja em Esmirna à morte e ressurreição de Jesus, que certamente
contribuiu para ajudar aqueles crentes fiéis a superarem o medo natural da morte
e do martírio.
O Exemplo da Igreja em
Esmirna
Conheço a tua tribulação, a tua
pobreza (mas tu és rico) e a blasfêmia dos que a si mesmos se declaram judeus e
não são, sendo, antes, sinagoga de Satanás. (Ap 2.9)
Jesus declara conhecer a real
condição daquela igreja, que implicava em constante e grande aflição (gr. thlipsin), e em extrema pobreza (gr.
ptocheian), mas que era
espiritualmente e essencialmente rica.
A condição da igreja em Esmirna
promove a desconstrução dos fundamentos da Teologia da Prosperidade e da Vitória
Financeira, fortemente difundidos nas Assembleias de Deus no Brasil pelo pastor
Silas Malafaia, através de seu programa de televisão. Os crentes de Esmirna eram
fiéis, mas tal fidelidade provocou a tribulação e pobreza material deles, visto
que na prospera cidade de Esmirna muitos foram obrigados a deixar os seus
empregos, tendo também os seus bens confiscados. [7]
Como bem adverte Kistemaker:
Isso não significa que os crentes
devam atrair perseguição e dificuldades a fim de ficarem ricos de possessões
espirituais; antes, Jesus quer que sejam fiéis, a ele e à sua palavra, mesmo
quando passam por dificuldades e abuso, porque então serão espiritualmente
bem-aventurados (Mt
5.11, 12; Tg 2.5)
É preciso ter cuidado para não
incorrermos no erro da Teologia da Prosperidade e da Teologia da
Miserabilidade.
O tipo de fé vivenciada pela igreja
em Esmirna deve provocar em nós uma reflexão sobre o tipo de fé que vivenciamos
em pleno século XXI. Até que ponto não estamos praticando algum tipo de
idolatria pós-moderna? Podemos não estar cultuando o “imperador”, mas será que
não cultuamos o “poder” do imperador? Quando pastores abandonam os seus
ministérios, ou dividem o pastoreio do rebanho com a política secular, não está
aí presente o culto ao poder? Quando líderes fazem acertos com políticos em
bastidores, chegando a negociar os votos da igreja em períodos de campanhas
eleitorais, visando em alguns casos tirar proveito em benefício próprio, de
familiares e de amigos, não estamos queimando incenso aos imperadores? Será que
não trocamos os deuses em forma de estátuas e imagens, por deuses em forma de
bens e recursos materiais?
O atual assédio dos políticos
mundanos em torno das Assembleias de Deus no Brasil, não deveria provocar em nós
desconfiança? Por que não éramos assediados quando não passávamos de um pequeno
grupo de “bodes barulhentos”? Por que nossos templos não eram visitados por
vereadores, deputados, senadores, prefeitos, governadores e presidentes na época
em que não tínhamos tanta expressividade numérica e visibilidade
social?
Será que diferente da igreja em
Esmirna, não fomos seduzidos, embriagados, entorpecidos e enganados pela glória
e honra do presente século, oferecida por satanás ao próprio Cristo (Mt
4.8-9)?
Qual é a real condição da igreja
evangélica brasileira, e em especial as Assembleias de Deus, diante daquele que
não apenas conhece todas as obras, mas que conhece também os nossos desejos,
vontades, motivações e interesses?
Que a igreja de Esmirna nos sirva de
exemplo e referencial de fidelidade a Deus, coragem e determinação.
[...] Sê fiel até à morte, e
dar-te-ei a coroa da vida. Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às
igrejas: O vencedor de nenhum modo sofrerá dano da segunda morte. (Ap 2.10c-11)
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